É cada vez mais comum, nas redes sociais, ver cartazes ‘rasurados’, ora com “cancelado” ou mesmo “adiado”. Esta informação, muitas vezes a vermelho, serve para dizer que os eventos artístico-culturais se rendem a força das manifestações populares convocadas pelo candidato presidencial Venâncio Mondlane, quem reclama vitória nas últimas eleições, entre outros problemas de ordem social, política e económica.

Estas manifestações, que encerram hoje (15) a primeira fase da chamada quarta etapa, para além de provocar distúrbios, vandalizações e mortes, obrigam o cancelamento de eventos culturais. Prova disso é o concerto de celebração dos 50 anos de carreira de Elvira Viegas, que estava marcado para a próxima quinta-feira (21) no Centro Cultural Moçambique-China, em Maputo.

De acordo com a nota de imprensa, “este adiamento deve-se ao contexto actual de manifestações que estão a decorrer no país, e a nossa querida Elvira acredita que a verdadeira celebração do seu quinquagésimo aniversário de carreira precisa de acontecer em ambiente de festa e alegria.”

Assim, prolonga-se a nota, o concerto será remarcado para o primeiro semestre de 2025, com a promessa de uma grande viagem musical que vai reviver os melhores momentos de carreira de Elvira Viegas, destacando as suas influências e contribuição imensa para a cultura artística moçambicana.

Entretanto, este não foi o único grande evento adiado. Também marcado para o Centro Cultural Moçambique-China, o bailarino Casimiro Nhussi viu-se obrigado a desactivar a sua “Noite de Esperança”, evento que tinha sido marcado para o dia 22 de Novembro, ou seja, um depois da proposta de celebração de Elvira Viegas.

E porque seria uma noite de esperança, os fundos seriam revertidos ao apoio às crianças afectadas pelo terrorismo em Cabo Delgado. Mas agora que o evento foi paralisado pelas manifestações com epicentro na cidade de Maputo (e noutras capitais provinciais), a “noite” terá “esperança” para os afectados pelas manifestações que provocam “terrorismo urbano”?

Outro grande evento, que seria no mesmo local, é da celebração dos 20 anos de carreira da Banda Kakana, marcado primeiramente para 1 de Novembro. Mas, por consequência da terceira fase das manifestações, foi adiado, até porque, de acordo com a nota publicada na rede social da banda, “este não é um momento para celebrações, mas para união e fortalecimento, na busca por um Moçambique onde a paz e o bem-estar sejam uma realidade para todos.”

O Museu Nacional de Arte adiou a cerimónia de inauguração da exposição “Campo Experimental”, da artista Ângela Ferreira, em colaboração com a historiadora Alda Costa, que tinha sido marcada para o dia 31 de Outubro.

A exposição que explora pesquisas materiais e ambientais realizadas nos primeiros anos da independência do país (1975), envolvendo diferentes frentes de trabalho seria a primeira individual de Ângela Ferreira numa instituição pública em Moçambique.

O título da exposição refere-se especificamente ao nome de um espaço de aprendizagem agrícola mantido no campus da Universidade Eduardo Mondlane, a partir de 1976, onde funcionários, investigadores e estudantes trabalharam em conjunto para produzir alimentos, conceber ferramentas e estruturas, e formar agricultores, camponeses e técnicos comunitários.

Mas antes, para o dia 25, a Cooperativa Musical tinha marcado o lançamento dos EP’s “Trânsitos sonoros”, de Lenna Bahule e “Halo”, de TRKZ, evento que teria lugar na Fundação Fernando Leite Couto.

O comunicado de adiamento do evento previa o lançamento para o mês de Novembro, no dia 14, acreditando que a tensão política pudesse ter refreado, mas, ao que tudo indica, este evento, agora, ficou para “uma data a anunciar”.

“No actual contexto em que o país se encontra, as condições não estão reunidas para a realização do evento”, escreve a Fundação Fernando Leite Couto, na sua conta oficial do Instagram, agradecendo, por conseguinte, a compreensão de todos.

Com cinco faixas, “Trânsitos sonoros”, de Lenna Bahule, é uma trilha que acompanha os ciclos do dia, evocando paisagens oníricas e contemplativas que fazem parte do nosso cotidiano. Já “Halo”, de TRKZ, conduz-nos a uma jornada espiritual. “Sempre fui fascinado pela simbologia do Renascimento, e, nestes temas, procuro retratar o que a espiritualidade significa para mim”, considera o artista numa nota de imprensa.

Para além destes destacados eventos, desde que rebentou a onda das manifestações, muitas iniciativas culturais foram bloqueadas, casas de cultura e casas de pastos foram encerradas, tornando um momento difícil para todos aqueles que actuam no universo das indústrias culturais e criativas.

Podemos também frisar a festa de rua, ou melhor, “uma banga de rua e cultura urbana”, denominada “Têiste Sama”, no âmbito do projecto “Cenas a tarde animam” que trazia o artista Gaba Cannal para o dia 9 de Novembro, na Rua d’Arte, em Maputo.

Este adiamento, por tempo indeterminado, baseia-se nos princípios “pelos quais sempre fomos guiados”, reiterando, “o nosso compromisso com a paz, segurança e justiça social e apelamos a todas as instâncias de direito que se guiem pelo humanismo e pela não-violência activa”, descreve o comunicado de cancelamento.

Os únicos eventos que ainda resistem a pressão das manifestações que encerram esta sexta-feira a primeira fase da quarta etapa são bares e restaurantes, que recebem apresentações acústicas e karaokes, mas nada de grande vulto e significado para o rendimento de músicos conceituados.

Vale frisar que pelo respeito ao público consumidor, todos os eventos cobráveis de que Entre Aspas tem conhecimento abriram a possibilidade de reverter o valor dos bilhetes pagos em pré-venda caso não se quisesse considerar a data por remarcar.

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Elcídio Bila

Elcídio Bila é jornalista há 10 anos, escrevendo sobre artes e outros assuntos transversais. Tem passagens por dois órgãos de comunicação e diversos projectos de Media. Trabalha também como copywriter e Oficial de Relações Públicas em agências de comunicação. É fundador e director editorial do projecto Entre Aspas.

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