É um exemplo vivo da riqueza da medicina tradicional, passada de geração em geração. Em muitas comunidades, especialmente entre mães e curandeiros, ‘o remédio de lua’ é visto como uma alternativa segura e eficaz para tratar determinados males.
Este tratamento natural desperta curiosidade tanto entre usuários quanto entre especialistas, consistindo na administração de uma mistura de plantas medicinais aos bebés recém-nascidos com o objectivo de protegê-los contra enfermidades, conhecida localmente como a ‘doença de lua’.
Trata-se de doença caracterizada pelo aumento anormal do crânio, desnutrição, distúrbios mentais, desmaios e inchaços nos pés. Este nome está associado à lua região sul do país, sob a crença de que as fases da lua podem influenciar na saúde dos bebés, sobretudo nos distúrbios mentais e desmaios. Este medicamento é administrado pensando nas melhorias ao menor.
Para muitos esta prática representa mais do que um simples tratamento, mas sim um elo com a ancestralidade e uma forma de resistência cultural enraizada no sul do país.
Para as mães, este processo de tratamento em medicinal tradicional pode prevenir ou aliviar os sintomas dessas condições temíveis para os bebés, logo após o nascimento ou nos primeiros meses de vida. A preparação do remédio de lua envolve o uso de plantas medicinais específicas, cujas propriedades são transmitidas de mãe para filha, um processo caracterizado por rituais que representam um profundo respeito pelas tradições.
De modo a entender melhor o processo de preparo deste remédio conversamos com Madalena Mulima, uma anciã residente na Vila da Manhiça, quem compartilhou a sua sabedoria sobre essa tradição de cura transmitida ao longo de décadas. Segundo Mulima, o conhecimento das plantas medicinais e a sua preparação são passados de geração em geração.
“Para a preparação do remédio de lua, usa-se ‘ximbitane’ – um conjunto de ervas – e folhas de ‘nembenembe’, uma planta de folhas verdes e flores amarelas que se assemelha a acácia. E o processo parte por arrancar folhas e depois pilamos e colocamos água. Então, é só guardar num cafurro ou na concha de caracol, daí já se pode dar ao bebé, em pequenas quantidades, seguindo orientações.
Para o médico Dércio Congolo, especialista em clínica geral, a medicina moderna incorpora diversos conhecimentos tradicionais. Não se trata apenas de práticas que possam ser rejeitadas, mas sim costumes que podem ser estudados de forma a serem associadas à medicina convencional, buscando benefícios e riscos.
Lina Muchanga e Júlia Ngovene encontraram amparo no “remédio de lua”
Lina Muchanga e Júlia Ngovene são duas mães com experiências pessoais no uso do ‘remédio de lua’. Ambas têm filhos que foram submetidos a este tratamento tradicional, com 8 e 4 anos, respectivamente.
“Eu pude usar o remédio de lua através dos ensinamentos da minha sogra que me apresentou os medicamentos de forma a combater uma lombriga que causa mau estar a criança, e pude notar que com o nascimento dos primeiros dentes da criança esta, durante a noite, tinha tendências a ranger os dentes, desde então passei a dar o remédio como forma a proteger o meu filho destas doenças e tenho que confessar que até hoje busco dar remédio de lua ao meu filho de forma que ele esteja saudável e só irei parar depois que ele completar 12 anos”, conta Lina Muchanga, mãe de um menino de 8 anos.
Por outro lado, Júlia Ngovene partilha que o remédio de lua é bastante importante para o fortalecimento da criança e conta que este é um remédio eficaz para estancar diarreia nos bebés.
Embora não haja evidências científicas sólidas que comprovem a eficácia do “remédio de lua” no tratamento da epilepsia ou da macrocefalia, esses depoimentos de mães como Lina e Júlia demonstram a profundidade de sua crença na tradição e na esperança de proporcionar um futuro mais saudável para os seus filhos.
Ramiz Pedro